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A bem da reposição da verdade, e depois de ter sido alvo de um vil ataque neste blogue, decidi divulgar as gravações integrais da viagem em família à Aldeia Natal de Óbidos, há coisa de duas semanas. O registo começa ainda em Lisboa:
João: VAMOS EMBOOOOOORA! Já passa das três da tarde e devíamos ter almoçado no caminho. Quando lá chegarmos já é quase de noite, vai estar um frio do caraças, e os miúdos vão constipar-se. Será que nós nunca conseguimos chegar a horas a lado nenhum? Por uma vez, só uma vez, uma única vez? Porque é que é sempre tudo TÃÃÃOOOOO difícil? VAMOS EMBOOOOOORA!
Uma hora depois, em plena A8.
Teresa: É esta a saída para Óbidos.
João: Não é nada esta a saída para Óbidos. A saída para Óbidos é lá mais à frente.
Teresa: O telemóvel diz que é aqui.
João: Não achas que se fosse aqui havia uma indicação na auto-estrada a dizer que era aqui?
Teresa: É agora, é agora! Sai! Por aqui é de certeza mais perto.
Vinte minutos depois, parados num caminho de cabras no meio da Estremadura.
João: Não me parece que seja por aqui.
Teresa: Pois não. É melhor voltar para trás.
Teresa: Olha, estão ali as caixas do correio para os miúdos colocarem as cartas para o Pai Natal.
João: Fixe, está feito. Podemos ir embora?
Teresa: Oi?
João: Isto está insuportável. Logo hoje é que a SIC tinha de se lembrar de vir para aqui fazer um programa em directo..
Miúdos: Papá!, papá!, queremos ir ver a casinha do Pai Natal!
João: Com uma fila destas? Vocês estão é malucos!
Miúdos: Vá lá, vá lá!
João: Só se for mais tarde. Não querem antes ir deslizar no gelo?
Miúdos: Sim!
João: Bolas, isto é alto. Olha o Sol a pôr-se, tão bonito... Vamos embora?
Teresa: Oi?
Gui: Papá, ajudas-me a levar a bóia até lá acima? Eu não consigo.
João: Porque é que não chateias a mamã?
Gui: Ela está a tomar conta da Rita.
Teresa: Eu estou a tomar conta da Rita.
João: Ok, Ok, eu vou.
Quatro bóias mais tarde.
Carolina: Aqui vou eu!
Tomás: Aqui vou eu!
Gui: Aqui vou eu!
João: Bom, já que estou aqui em cima, e tendo em consideração que a maneira mais rápida de descer, de modo a ir a correr para junto dos meus filhos, e assim continuar a ajudá-los a divertirem-se imenso, é deslizando em cima de uma bóia, vou deslizar em cima de uma bóia. Não por prazer, mas por dever. Aqui vou eu, com uma postura séria, profissional e não particularmente divertida.
João: Já pratiquei actividades mais espectaculares.
Miúdos: Papá!, papá!, queremos ir outra vez!
João: Outra vez?
Miúdos: Sim!, sim!, sim!
João: Mas só mais uma vez, ok?
Dezasseis bóias mais tarde.
João: Já não aguento mais isto. Adeus, Óbidos!
Teresa: Estás bem, amor?
João: Snif, snif. Quero ir-me embora!
Todos: Ainda falta uma coisa.
João: O quê?
Teresa: A casinha do Pai Natal.
João: NÃÃÃÃOOOOO!!!
Quarenta minutos depois, na fila para a casa do Pai Natal.
João: A sério, não aguento mais! Estão cinco adultos à nossa frente. Eles acreditam mesmo no Pai Natal ou acham que isto é uma casa da luz vermelha cheia de mães Natal em trajes menores? Óbidos, a Vila Delírio... Eu próprio já não me estou a sentir nada bem...
Carolina: O que se passa, papá?
João: Lálálálálálá, lalálálálá, lálálálálá...
Carolina: Mamã, o papá não está nada bem.
Teresa: Parece-me uma intercorrência de delirium secantum, psicose que dá às pessoas stressadas quando estão a apanhar uma grande seca. Isso depois passa.
Carolina: Coitadinho.
João: Uuuuhh, uuuuuhh, sou uma rena louca! Dança comigo, Carolina.
Vinte minutos depois, dentro da Casa do Pai Natal.
Teresa: Estás melhor?
João: Aqui dentro já não é tão aborrrecido. É simplesmente parvo. Aquilo é um duende humorista? Mas mais meia hora nesta vila e eu enlouqueço de vez.
Meia hora mais tarde.
João: Preciso de um sítio normal onde haja menos de 18 pessoas por metro quadrado. O meu reino por um sítio normal, onde consiga estar dois segundos sem dar três encontrões!
Teresa: Está ali uma livraria.
João: Sim, sim, uma livraria. Preciso disso.
João: Tem algum livro do Vasco Pulido Valente? Preciso de textos cínicos, desencantados, que acham que o mundo é uma desgraça e que o Pai Natal não existe.
Senhora da loja: Que lhe parece este?
João: O País das Maravilhas. Perfeito. Era mesmo aquilo que precisava.
Senjora da loja: Aqueles dois miúdos selvagens que estão à beira de destruir a minha loja são seus filhos?
João: Não.
Teresa: Amor!
E foi assim que as coisas se passaram, como poderei testemunhar em sede própria. Tudo o resto são calúnias de felicidade.