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O amor seria menos intenso se não tivéssemos filhos? #1

por João Miguel Tavares, em 15.10.14

Escreveu a leitora Ines nos comentários a este post, que por sua vez comentava este post:

 

Não entendi a parte em que diz que os seus filhos são fruto do amor do casal. O amor seria menos intenso se não houvesse crianças? Poderiam ser um casal sem filhos muito feliz! Ou então, teve filhos só porque a Teresa queria? E vive uma vida completamente contrariado? Vezes quatro?

 

Eu admito que o meu post anterior era meio opaco, e estas objecções dão-me oportunidade para esclarecer a minha posição sobre o tema. Vamos, então, por partes.

 

Não entendi a parte em que diz que os seus filhos são fruto do amor do casal.

 

Estou convencido que o sociólogos e antropólogos do futuro considerarão a invenção da contracepção, e da pílula em particular, como um momento fundador na história da humanidade, em que a relação dos casais com a paternidade muda de forma radical. Por vezes nós não temos essa noção, porque estamos imersos no momento, mas a nossa geração está a viver uma revolução naquilo que são as relações familiares, e a invenção da contracepção feminina é um facto absolutamente estruturante.

 

Claro que há sempre azares e pessoas que têm filhos acidentalmente, mas mesmo os católicos ignoram olimpicamente as directrizes da Igreja em relação aos anticoncepcionais, e eu não tenho dúvidas em classificar a famosa encíclica Humanae Vitae (1968) e a sua visão da regulação da natalidade como um momento muito infeliz na história da Igreja. Espero que essa visão venha a mudar brevemente, porque nove em dez católicos não conseguem sequer perceber - porque, simplesmente, não se percebe - por que raio a utilização de um preservativo interfere na sua relação com Deus.

 

Diante destes factos, ter um filho a partir do último quartel do século XX é, sobretudo, ter o fruto de uma relação amorosa. Os "acidentes" diminuíram drasticamente, ou então são acidentes relativamente consentidos (é o meu caso e da Teresa, já que nenhum dos quatro foi planeado), e a partir daí aconteceu algo muito natural: o número de filhos por casal diminuiu e eles tornaram-se cada vez mais preciosos e desejados. Toda esta mariquice com os filhos, de que este blogue é uma belíssima prova, seria impensável antes da criação de uma cultura contraceptiva.

 

(O que não significa, atenção - antes que me apareça aí alguém que recusa a pílula e o preservativo por fidelidade à Igreja -, que quem usa os métodos naturais não adore os seus filhos tantos como os outros. Contudo, ter muitos filhos será, nesses casos, uma opção assumida, quando antigamente era uma coisa que simplesmente acontecia, e estava dependente sobretudo da fertilidade do homem e da mulher.)

 

É por isso que os filhos raramente são, nos dias de hoje, algo que não o fruto do amor do casal - donde, existe, de facto, para quem os tem, uma espécie de sentimento de completude, em que a relação a dois passa a ser a base de uma relação a três, quatro, cinco, seis (o meu caso) ou mais, que compõem aquilo a que se chama "família".

 

Retomando a questão da Ines (suponho que seja Inês, mas eu respeito o nome inscrito no comentário):

 

O amor seria menos intenso se não houvesse crianças?

 

Não, não seria. Acho até que poderia ser mais intenso (tomando "intensidade" num sentido mais próximo da paixão e da multiplicação de gestos de amor quotidianos).

 

Mas isso, se não se importam, fica para o próximo post, que este já vai longo.

 

Funny-true-love-cartoon.jpg

 

publicado às 08:51


41 comentários

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De Anónimo a 15.10.2014 às 17:57

Claro, sem agressividades. Apenas a conversar sobre perspectivas diferentes. Gosto sempre de conhecer o outro lado. Não tenho certezas absolutas, por isso agradeço a s/ resposta.
Continuo a dizer que tem razão em muitas coisas, mas que ainda não estamos preparados para saber escutar a natureza.
Mesmo em relação aos métodos contraceptivos, mormente a pílula, que não tem grande ciência do ponto de vista que é tomar e pronto, há mulheres que mesmo assim não entendem que há regras que têm de ser cumpridas - ex. não esquecer nenhum dia, ter cuidado com antibioticos, etc... e depois ficam admiradas como engravidaram, porque afinal "só foi um esquecimento", por isso acho que ainda temos muito caminho a percorrer.
Trabalho com famílias que se não fosse a pílula e, entretanto, a laqueação definitiva tinham filhos todos os anos e não, não os podem criar. Não têm condições económicas, afectivas e físicas para os ter.
Para já e (também) por isso vejo a pílula (e outros tipos de contracepção) como um mal (ainda) necessário.
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De Teresa Power a 15.10.2014 às 18:08

Exatamente! Um mal ainda necessário. Eu também concordo! Mas também o Papa disse um dia - para grande escândalo de muita gente - que às vezes é melhor usar o preservativo. Claro! Se eu não tenho qualquer valor, se eu vivo sem respeitar o outro, se eu não procuro o bem do outro, então é melhor, sim. É melhor usar seja o que for para não gerar filhos que vou maltratar, deixar a passar fome ou abandonar. Agora, se sou cristão - não de boca, mas de vida - isso já não é possível, pelas razões que dei no meu primeiro comentário e que se prendem com a natureza do sacramento que recebi. E se, não sendo cristão, quero evoluir no respeito pela natureza - que está literamente intoxicada pela pílula, dos peixes aos mamíferos - e pelo meu corpo, nesse caso tenho de aproveitar todas as oportunidades para descobrir outras formas de planear a minha família.

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