Saltar para: Post [1], Comentar [2], Pesquisa e Arquivos [3]





Olhem eu a ver a minha vida andar para trás

por João Miguel Tavares, em 11.11.14

Por causa deste texto da Helena Matos, fui ter a esta notícia do Observador, baseada neste trabalho do El País (bem-vindos ao maravilhoso mundo da world wide web).

 

E subitamente dei por mim embasbacado face à notícia em causa, que pode por antecipação dar cabo de toda a minha velhice, se tiver tido o azar de me saírem uns filhos calões na rifa. Ora leiam bem:

 

Há tribunais espanhóis que estão a obrigar os pais a pagar pensões de alimentos a filhos com 30 anos sob o argumento de que estes, com a crise económica, não conseguem encontrar trabalho e emanciparem-se.

 

Note-se que estamos a falar de... 

 

...adultos de 28/30 anos a quem os pais são obrigados a pagar pensões de alimentos – porque a crise económica os impede de serem independentes.

 

E isto é porque os espanhóis têm leis malucas?

 

Não, não é:

 

Nem a lei espanhola, nem a portuguesa, estabelecem um limite de idade para a pensão de alimentos. (...) A advogada Teresa Apolónia lembra que, depois dos 18 anos, cabe ao próprio filho pedir ao tribunal que o pai lhe pague a prestação de alimentos. Mas a lei exige que haja aproveitamento escolar, caso contrário o pai ou a mãe podem alegar que ele não está a cumprir a obrigação.

 

Ou seja, se o gajo quiser fazer licenciatura, mestrado, pós-graduação, doutoramento e pós-doc, tudo de seguida e com aproveitamento, eu posso ser obrigado por um tribunal, já septuagenário e caquético, a sustentar um quarentão. What the fuck?

 

E não, não é ficção científica espanhola. Também já há filmes idênticos em português: o artigo do Observador cita um acórdão da Relação de Lisboa que obrigou um pai divorciado a pagar a pensão de alimentos a uma filha de 22 anos que não lhe falava há anos. Diz o acórdão:

 

Cremos que melhor representa os sentimentos dominantes da nossa sociedade a ideia, que é a nossa, de que o amor incondicional dos pais pelos filhos exige que os primeiros lhes proporcionem os meios necessários para singrarem na vida, mesmo quando os filhos não têm o comportamento que deles é esperado.

 

E agora, a parte snif, snif:

 

Resta, igualmente, esperar que a filha do Recorrente, apesar de eventualmente ninguém a ter ensinado a amar e respeitar o pai, como este gostaria, o venha a aprender, por si própria, com a maturidade da idade adulta. Para tanto, ajudará observar que o pai, embora sem retorno afetivo, sempre a apoiou, pelo menos em termos materiais.

 

Amor incondicional mas é o caraças. Ou melhor: amor incondicional, sim, com certeza, mas por decisão dos progenitores - não "amor incondicional" imposto por um juiz a um pai quando a filha é maior de idade e não lhe liga patavina. Afinal, isto é um acórdão ou um excerto de um livro de Nicholas Sparks?

 

Nesta cada vez mais assolapada civilização cutchi-cutchi, acho que anda tudo a ficar doido. Então com 18 anos um filho é livre para sair de casa mas um pai não é livre de o pôr fora? Que sentido é que isto faz?

SpoiledChineseKids.png

 

 

publicado às 10:35


1 comentário

Sem imagem de perfil

De LG a 12.11.2014 às 10:24

Se os filhos querem ser grandes para umas coisas, não têm de o ser para outras? Onde e quando acaba a responsabilidade dos pais e começa a dos filhos? Essas fronteiras não surgem naturalmente, quando estamos entre gente equilibrada?

Alguém desenvolveu, nos comentários, uma tese curiosa e muito batida: os filhos não pediram para nascer, por isso os pais têm obrigação de os sustentar ad eternum, até porque, se os filhos têm dificuldades, a culpa é dos pais, de uma forma ou de outra. Vamos por partes: defender que os pais tornam-se devedores dos filhos por os terem feito nascer faz tanto sentido como o pai ou a mãe dizerem o oposto: "Meu filho, tens uma dívida para comigo porque te dei a vida. Agradece e paga, sff".

Quanto à culpa dos pais no insucesso dos filhos, na crise ou no estado do tempo: e que tal crescermos e sermos homenzinhos e mulherzinhas que sabem o que é a gratidão e a responsabilidade?

Comentar:

Mais

Se preenchido, o e-mail é usado apenas para notificação de respostas.

Este blog tem comentários moderados.




Os livros do pai


Onde o pai fala de assuntos sérios



Arquivo

  1. 2018
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2017
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2016
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2015
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2014
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2013
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2012
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D