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A Associação dos Pais Alérgicos a Eduardo Sá

por João Miguel Tavares, em 11.04.13

Por causa dos comentários a este meu post, fiquei a descobrir que terei companhia no dia em que formar a Associação dos Pais Alérgicos a Eduardo Sá (APAES). E dei por mim a matutar: porque é que o pobre homem me irrita tanto se nunca me fez mal? É certo que posso sempre encontrar momentos, como aqui, em que sinto que frases como “brincar sozinho não é brincar, é uma forma de iludir a falta de brincadeiras” são genuinamente falsas - e eu tenho toda a minha infância mais ou menos solitária para o provar. Brincar sozinho não só pode ser maravilhoso, como te ajuda a alargar o teu mundo mental e conduz a tua imaginação para sítios que nunca suspeitaste que ela pudesse ir.

Mas boa parte das vezes eu nem sequer discordo substancialmente daquilo que Eduardo Sá diz. Muitas vezes, até concordo. Acho que aquilo que eu não suporto é mesmo a forma que ele tem de o dizer. Aquele seu tom mavioso, sonolento e adocicado, aquela espécie de falso nirvana vocal, deixa-me doido. Depois, como a cavalo da voz vêm frases que nós escrevíamos nas poesias de oitavo ano - "A frieza é o congelador do desespero" -, ou elaborações gramaticais que nos dão um nó cego no cerebelo - "É certo que quase nada vale por aquilo que parece. E, no entanto, talvez o que pareça valha sobre o quase-nada que lhe falta para ser tudo aquilo que não é" -, a coisa torna-se difícil de suportar. Até porque tudo isto, bem espremido, não exprime coisa nenhuma.

Mas se analisar bem o meu interior para tentar descobrir o quase-nada que me falta para saber tudo aquilo que me leva a querer fundar a APAES, diria que o que tenho mais dificuldade em suportar em Eduardo Sá é aquela sensação de olhar de superioridade sobre as coisas, de quem já pensou muito sobre tudo, e para tudo tem resposta. A frieza desse olhar é o congelador que me leva ao desespero. E porquê? Porque ele parece sempre exterior a tudo aquilo de que fala: a voz quer fazer-se íntima, mas eu sinto-o sempre tão, mas tão distante. É como se ouvisse o barulhinho dos seus mecanismos mentais a funcionar, como se ele estivesse permanentemente em palco. E por isso tudo o que diz me parece ensaiado, mesmo quando concordo com o que está a ser dito.

Coitado do homem. Se calhar é um santo psicólogo, uma pessoa encantadora a quem muitos devem muito, e eu estou a ser profundamente injusto. Eu próprio tenho um blogue (não sei se conhecem) onde passo o tempo inteiro a pregar sobre a minha família, e certamente que de vez em quando também me saem frases poeta-palhaço. Em minha defesa, digo apenas isto: eu, pelo menos, envolvo-me. Digo que erro, que faço treta, que não tenho pachorra para aturar os putos, que estou farto disto. Ponho-me a mim, e à minha vida, nos meus textos. Eduardo Sá não. Ele nunca. Porque ele está sempre a planar, no seu aparelho vocal zen, por cima de todos nós. E pronto. Nestes casos, não há nada a fazer. Apetece-me sempre pegar na fisga, apontar e pau! Sai uma APAES. Posso estar a ser um idiota? Em bom rigor, é perfeitamente possível. E tento nunca me esquecer disso. Mas eu ao menos admito que não sei. Ele não.

 

publicado às 11:27


66 comentários

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De Mags a 11.04.2013 às 15:10

Adorei o seu texto, ainda sem saber quem era Eduardo Sá.
Depois, fui ver a entrevista que linkou aqui. Estou quase a dormir.... Como alguém já disse, é a voz, é a maneira de falar... é profundamente irritante! Os olhinhos a revirar, os sorrisos apalermados como que a ridicularizar os pais que não fazem ou não conseguem fazer de acordo com a cartilha... De resto, quanto ao conteúdo, eu até concordo com o que diz. Pena a forma, de facto.
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De Unknown a 11.04.2013 às 15:03

E que tal conversar? Frente a frente?
Isto de falar pelo teclado... não dá certo.
A seguir a saber ouvir, talvez saber falar. Frente a frente.

P.S. Salvo melhor opinião.
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De Formiguinha a 11.04.2013 às 14:33

Bora lá!!!!!
Tb concordo com a maioria das coisas mas irrita-me de morte!
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De João Miguel Tavares a 11.04.2013 às 14:16

Eh lá, Coimbra é demasiado próximo...
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De Anónimo a 11.04.2013 às 14:14

mais um para o clube ... desde coimbra!
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De Vitor Cabeça a 11.04.2013 às 13:51

Ora aqui está um post (ou posta?) de substância que ajuda a minha vida como pai... Ajuda-me a compreender-me melhor do que as exposições do Eduardo Sá, que até psicólogo. Curioso, não é?
E ajuda-me porque fico a comprender melhor porque sinto um certo incómodo e alguma irritação perante as prestações públicas desse profissional.
Eu até estudei psicologia. E isso ajuda-me a compreender como na actividade da psicologia clínica e educacional há tanta declaração abusiva, porque nada sustentada em investigação sólida, seja experimental, estudos longitudinais controlados. ou outras técnicas controladas metodológicamente. De facto, há muita contaminação pela ideologia pessoal. E isso é deprimente e perigoso, porque é referido sob uma presumível autoridade. Tal como são ditas muitas banalidades e generalidades que nada têm para seu suporte a não ser o maior inimigo de uma postura científica: o senso comum.
Parabéns João Miguel! Quanto é que são as quotas?
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De SN a 11.04.2013 às 13:42

E sou só eu que nem sempre sabe do que ele está a falar? Aquela psicologia metafisica dá cabo de mim.
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De Bruxa Mimi a 11.04.2013 às 13:36

Eu acho que nunca ouvi a voz do Eduardo Sá... mas fiquei com vontade de ouvir para poder formar a minha opinião! Antena 1 - como sintonizo? E "hora de jantar" corresponde a que horas (entre as 19h e as 21:30h, para não dizer mais tarde, é tudo hora de jantar!)?
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De MarianaS a 11.04.2013 às 13:08

Acho que essa alergia também já afecta as crianças! A nossa Margarida, quando à hora de jantar, na cozinha, o rádio está ligado na Antena1, pede que se mude a estação, porque "odeia ouvir a voz do Eduardo"...
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De Maria João Resende a 11.04.2013 às 12:55

A voz!! É a voz! Ou, melhor dizendo, o tom de voz e o modo de falar (o quase sussurro, o vagar das palavras) que são, não só irritantes, como parecem indiciar uma enorme falta de espontaneidade, de autenticidade, de humanidade, quase. Soa tudo a falso, a mil vezes mastigado e pouco ou nada vivido, a prédica de segunda ou terceira categoria. Aposto que o homem quando se entala numa porta em vez de um saudável 'Poxxa!' deve dizer algo do género: 'Oh porta malvada que me infligiste tamanha dor!'.
Quanto ao conteúdo, não sei, porque me irrita tanto que nem me ocorre ficar a ver (talvez, também por ser mãe de uma criança com mais de 25 anos, confesso). Mas faria de bom grado parte da APAES ou seria sócia fundadora da AFAAES (Associação de Futuros Avós Alérgicos a Eduardo de Sá)

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