Este é Mario Balotelli, o grande
bad boy do futebol actual. Eu gosto do Balotelli: para além de ter uma
história de vida especial, é grande jogador, imprevisível e bastante maluco, o que é de saudar num desporto cada vez mais feito de jogadores plastificados, que só vão às conferências de imprensa dizer que é preciso respeitar o adversário, que o mais importante é a equipa e que é preciso levantar a cabeça. Balotelli não alinha. E toda a gente (excepto os seus treinadores) adora desalinhados.
Apresentado Balotelli, importa agora apresentar a nova namorada de Balotelli, Fanny Neguesha, uma modelo belga sobre a qual ele disse: "é a primeira mulher com quem me sinto confortável". Tendo em conta que as modelos com quem ele andou davam para fazer vários desfiles da Moda Lisboa, esta pode ser entendida como uma comovente mensagem de amor.
A relação entre os dois parece, portanto, ir de vento em popa, ao ponto de ela até já partilhar momentos de grande intimidade no Instagram:
Bonito. Mas não se assustem, que este blogue não se tornou subitamente cor-de-rosa. Toda esta história tem um motivo, que são
estas declarações de Mario Balotelli: "se o Real Madrid [NR: para quem não acompanha o futebol, o Real perdeu na Alemanha com o Borussia por 4-1 na primeira mão das meias finais da Liga dos Campeões] conseguir passar esta eliminatória, deixo que a minha namorada durma com todos os jogadores". Ah. Ah. Ah. (Gargalhada seca.)
Graças a esta frase tive ontem uma enérgica discussão na redacção da Time Out. A rapaziada do meu trabalho estava toda animada a comentar as declarações do jogador italiano, como quem celebra a mais recente manifestação de absurdo balotelliano. E eu, estranhamente, acabei a fazer a figura do avozinho, que é uma coisa que sempre me aflige. Se calhar sou eu que estou a ficar quadradão, mas sempre lidei mal com objectificações neanderthais de mulheres.
Se essa objectificação for voluntária, ou seja, se ela partir (livremente) do lado da mulher, eu não tenho nada contra. No meu entendimento, cada um tem o direito a fazer com o seu corpo o que bem lhe apetecer, seja prostituir-se ou fazer de bibelô em anúncios de automóveis. Se a frase do Balotelli fosse "a Fanny disse-me que estava doida por papar o plantel inteiro do Real Madrid, e eu disse-lhe que por mim tudo bem, desde que eles ganhem ao Dortmund", eu não teria nada a objectar. Era vontade da Fanny e o gang bang é uma actividade muito democrática.
O meu problema com a frase de Balotelli é que a Fanny não disse nada. E ao não dizer nada, Balotelli aparece na comunicação social a
oferecer a namorada, como se ela fosse propriedade sua. Há quem ache divertido, há quem ache que é uma simples piada - mas eu, que me rio de tanta coisa, e que me honro de ser um gajo muito pouco susceptível, neste caso pendurei o meu melhor sorriso amarelo.
Rir de alguém que está a oferecer aos outros a sua mulher é sempre ficar do lado daquele marialvismo bacoco que tem dificuldade em olhar para o sexo feminino sem as lentes da subserviência. Eu escutei argumentos como "afinal, é mulher de um jogador de futebol" - e todos nós sabemos que as mulheres dos jogadores de futebol são um bando de gajas indistintas a querer dar o salto na horizontal e sempre doidas por pinar com qualquer caparro musculado, não é?
Muitas delas até podem ser. Mas isto é como Abraão a interceder por Sodoma: ainda que só haja um justo na cidade, ele não merece ser confundido com os outros. Generalizações e objectificações no que diz respeito a seres humanos são coisas mesmo muito feias. E tratar alguém como se não tivesse existência e vontade próprias dá-me cabo dos nervos. O Balotelli até pode ser o maior. Mas naquele caso foi um grande parvalhão. Ele que peça desculpa à Fanny e não volte a repetir. Ou então que ofereça o seu próprio traseiro para divertimento do balneário do Real Madrid.