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Na segunda-feira, eu tinha prometido responder ao comentário da Diana Figueiredo sobre a Miley Cyrus, mas antes de o fazer sinto alguma necessidade de sair em sua defesa, visto que ela foi alvo de alguns comentários mais agressivos do que seria desejável.
Nós aqui no Pais de Quatro temos um entendimento muito lato da liberdade de expressão, e desde que não se chamem nomes às pessoas ou se tente deliberadamente sabotar a discussão com comentários incompreensíveis, tudo é permitido. Ainda por cima, tendo em conta que eu próprio tenho um estilo provocador e que sou apreciador do músculo argumentativo e da ironia, não me vou estar a armar em virgem ofendida quando alguém diz mal do que escrevo.
Chateia-me bastante mais, contudo, quando sou eu que tomo a opção de puxar para o corpo central do blogue alguém que tem uma opinião contrária à minha e a expressa na caixa de comentários, e esse leitor (neste caso, leitora), que até deu o seu nome e teve a simpatia de deixar aqui a sua opinião, é vítima de tratos de polé. Não é bonito, porque sinto que, de certa maneira, fui eu que a amarrei ao poste para depois outros leitores lhe poderem mandar flechadas, como nos filmes de índios e cowboys. Tivesse o comentário da Diana Figueiredo permanecido no meio da caixa de comentários e muito menos gente se teria indignado com ele.
No entanto, eu gosto de valorizar certos comentários dos leitores e de dar-lhes destaque - é uma forma de este blogue ser mais dialogante do que é hábito na blogosfera. E não queria, mesmo, perder isso. Donde, pediria, se possível, que os leitores fossem um pouco mas meigos quando se trata de responder a leitores que receberam um destaque que não pediram, e que reservassem o seu melhor fel para mim, já que levar porrada pelo que escrevo faz parte da minha profissão, e vou tendo o lombo bastante calejado.
Agradeço por antecipação.
Tendo em conta que:
1) A co-autora deste blogue já se anda a queixar publicamente do meu excesso de divagações filosóficas:
E que:
2) Alguns leitores, como a Marta (mas não só), concordaram com ela:
Nunca mais voltei ao blogue porque já não consigo ler tanta matéria sobre os filhos.
Decidi que nesta semana de 10 de Junho e Santos Populares e montes de pontes e feriados, o Pais de Quatro vai ser só conhaque e futilidades, que eu não quero que o pessoal comece a fartar-se de mim - para isso, já me basta a esposa -, e muito menos que caia na tentação de me transformar no Eduardo Lourenço das famílias numerosas.
Portanto, já de seguida, um post sobre mosquitos.
Na caixa de comentários deste post, o LA-C e a Teresa Power tocam num ponto fundamental.
LA-C:
Tens uma capacidade notável para fazer generalizações a partir do teu quintal. Confundes Portugal com o teu círculo de amigos. Tens uns amigos que te mandam umas bocas por não seres divorciado e sentes que no país as pessoas que ainda têm uma concepção tradicional de família são uma minoria. Agora, lá porque tens uns amigos que se encontram contigo para desabafar, e se queixam de que centram a vida nos miúdos, pensas que isso é generalizado.
Teresa Power:
Agora que esta caixa de comentários acalmou, e corro menos riscos de apanhar com uma garrafa na cabeça - um post sobre a agressividade nos blogs seria um tema interessante! - só venho dizer uma coisa: tens toda a razão, João, em relação a muitas coisas. Mas vem à minha escola, dá uma voltinha no pátio durante o recreio e entrevista alguns alunos... Tu e eu vivemos certamente em "quintais" - como LA-C disse aqui - diferentes, pois o que eu vejo todos os dias, e o que tenho abundantemente nas minhas turmas, ano após ano, e em escolas diferentes - os professores são saltimbancos... - são filhos mal-amados, filhos humilhados, filhos abandonados diante do televisor, filhos a quem os pais até amam, mas não sabem como fazer para o demonstrar... Claro que, como bem dizia alguém, estes pais não lêem nem Estivill, nem Gonzalez, nem Mário Cordeiro, nem JMT. A revista preferida dos meus alunos é a "Maria"... Tu és jornalista, mas eu sou Diretora de Turma há muitos anos!
Ambos têm absoluta razão nas suas críticas. Cada um fala a partir do seu lugar, e este é um blogue de um casal burguês e urbano de classe média - não média alta, mais mais alta do que a média - com quatro filhos que andam no ensino público mas têm aulas de inglês, e natação, e piano, e variadíssimos privilégios que não estão ao alcance de inúmeros pais.
E, por isso, as preocupações de que aqui dou conta são, em primeiro lugar, preocupações burguesas, de que quem se pode dar ao luxo de procrastinar um bocado. Portanto, convém limitar o território. Eu acho que as minhas preocupções são semelhantes às de quem me lê, ou este blogue não teria tanto sucesso, mas lá está: para ler blogues também é preciso tempo e acesso à internet. Fica aqui assumidíssimo: as minhas generalizações só se aplicam, em termos de audiências, de classe C para cima.
Perdoem-me antecipadamente a imodéstia deste post, mas eu espero em breve poder justificar melhor este pequeno momento de vaidade pessoal. O Tiago Cavaco fez no seu sempre excelente blogue uma avaliação pessoal de 2013, ordenada de A a Z, onde atribui o T de Tavares a mim e à Teresa.
Aquilo que ele diz é muito importante para mim, porque é um texto que vê por dentro o que somos e que explica na perfeição - melhor do que eu seria capaz - porque gostamos de partilhar a nossa vivência familiar no espaço público. Há muito tempo que eu ando para escrever sobre isso, e não sei bem se o Tiago me tirou ou me colocou as palavras na boca. Certo, certo é que lhe estamos profundamente gratos pela generosidade das suas palavras, que aqui ficam com uma certa baba e a devida vénia:
T. Tavares
Conheci o João Miguel Tavares na Faculdade. Ou melhor, conheci-o a ele mas ele só me conheceu a mim uns anos mais tarde. O João era do ano anterior e já na altura tinha reputação entre os miúdos do curso de Ciências da Comunicação. Fui acompanhando-o depois no DN e depois quando, com o Mexia e o Lombra, integrou a "Geração de Setenta". Fast forward e hoje o João é meritoriamente um nome incontornável na nossa imprensa. Este ano encontrámo-nos umas quantas vezes e nasceu uma amizade entre as nossas famílias. Aliás, mais que uma amizade, nasceu uma admiração dos Cavacos pelos Tavares.
A Teresa e o João são o único casal público que conheço que assume a condição da família como exemplo cívico. Não quero teorizar muito sobre isto, até porque eles merecem melhor, mas resumiria desta maneira: os Tavares mostram-se como família sem o pudor imposto por uma cultura que supostamente protege a família não por razões familiares mas por razões individualistas. Com todo o respeito pelos meus amigos que escolhem fazer diferente, creio que esconder as nossas crianças da exibição pública diz mais sobre o que pensamos acerca de nós mesmos do que sobre o que pensamos acerca delas. Pode funcionar como um narcisismo retroactivo, coroados que nos sentimos pelo modo tão sensível como conseguimos separar o privado do público.
A partir do momento que somos pais, acreditem, a manutenção da linha que separa o público do privado é seguramente a tarefa menos importante que nos é dada. A partir do momento que somos pais, acreditem, temos uma responsabilidade pública. Se a soubermos viver publicamente faremos muito mais por todas as restantes individualidades. Com isto não sugiro que os pais pespeguem ao segundo a vida das suas criancinhas online, mas que entendam que boa parte da reserva de proteger a família do olho colectivo pode ter mais cinismo que coração. Olhem para o exemplo da Teresa e do João. Sem exagero, é das melhores coisas a acontecer na nossa vida pública. Mostra coragem, uma qualidade muito perdida nos nossos dias tão calculistas.
Quando hoje fui ver as estatísticas do Pais de Quatro, eis que me deparo com o número de visualizações do último mês: 316 018. São números impressionantes, e que nunca tinha antes atingido - longe disso. O meu obrigado à Sapo pelo apoio (a presença de posts na sua homepage faz maravilhas) mas, sobretudo, um grande, grande obrigado aos leitores por toda a atenção que nos têm dedicado.