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A minha alergia aos lares de terceira idade #2

por João Miguel Tavares, em 13.11.14

Comentário da Maria C., sempre pertinente:

 

O JMT defende a liberdade de os filhos tomarem as suas próprias decisões, mas depois julga-os moralmente. E a minha questão é esta: sem saber a história daquela família em concreto, será que podemos julgar?


Uma coisa que a mim me parece desajustada sempre que se fala deste assunto é comparar os idosos às crianças. Posso estar errada, mas para mim são assuntos completamente diferentes. É que as crianças nunca foram outra coisa senão crianças, ao passo que os idosos têm um passado. Ora os afetos que daí resultam podem ser muito distintos. Ou seja, o que eu quero defender, basicamente, é que há nesta questão dois aspetos independentes.

 

Por um lado, os idosos devem, sim, sempre, ser tratados com toda a dignidade e ter acesso aos cuidados de saúde adequados - daí eu também defender que o Estado deve garantir que todos têm direito a um lar decente. Mas quanto aos afetos dos filhos e da família, não podemos esquecer que eles assentam numa história comum, às vezes feliz e cheia de boas memórias, outras vezes nem por isso.

 

As pessoas que hoje são idosas foram, há uns anos, pessoas em idade ativa. Nos casos de que falamos, elas foram pais e, possivelmente, avós. E eu acho que não podemos julgar moralmente a decisão dos filhos e dos netos quanto a ter ou não esses idosos em sua casa sem saber que tipo de relações é que eles construíram ao longo dos anos.

 

Para usar um exemplo extremo: um pai que batia no filho a torto e a direito, que nunca quis saber dos êxitos e das suas dificuldades, etc., depois, em idoso, fica dependente, continuando a ser um chato, egoísta, com mau feitio, que dá cabo do juízo a todos à sua volta. O filho decide pôr o pai num lar, porque não está para ter a sua própria vida enfernizada, dia após dia, por mais dez ou vinte anos. Quem somos nós, JMT, para dizer que o filho, ao tomar esta decisão, está apenas a exercer a sua "triste liberdade de ser um filho da mãe"? 

 

Não somos ninguém, Maria C., como é óbvio. E eu espero que quem lê o PD4 há algum tempo perceba que eu me imponho alguma radicalidade de princípios sem os querer transformar em dogmas absolutos, completamente cegos às situações concretas. Aquilo que eu enunciei no post anterior, naturalmente, é uma regra geral para situações gerais, não uma regra absoluta para todas as situações.

 

Uma regra, em última análise, que se aplica à minha família, onde os pais sempre se esforçaram pelos seus filhos. Felizmente, diria que essa é a situação mais comum. Na caixa de comentários há exemplos de outros casos extremos em que esta regra geral não faz sentido ser aplicada. Tenho perfeita consciência de que a vida salta sempre por cima das cercas que nós montamos. Mas também sei que é muito mais comum o egoísmo e autocentramento dos filhos do que as excepções que o justificam.

 

Colocar um pai ou uma mãe num lar transformou-se numa situação banal e normalíssima. Não deveria ser uma situação banal nem normalíssima. 

 

publicado às 09:42


23 comentários

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De Cristina Baptista a 14.11.2014 às 14:08

Como profissional de saúde que já assistiu ao "despejo" de idosos à porta do S.Urgência Hospitalares por familiares cujas identidades se verificam depois serem falsas, compreendo perfeitamente parte do que advoga. Também a mim me choca muito ver idosos abandonados, incapazes de valer a si mesmos, tratados como "monos". Incomodam-me imagens de muitos lares de idosos (e atenção que não estou a dizer que são todos iguais) onde vemos pessoas sentadas em frente à televisão a babar, numa inactividade crua, tratados por outros seres humanos como se em linhas de montagem estivessem, à espera do fim. A desejar ardentemente o fim.
Nunca me passaria pela cabeça fazer isto aos meus pais. E se por alguma eventualidade não pudesse MESMO, tê-los comigo, procuraria que estivessem na sua casa, cuidados por outras pessoas. Mas gostaria também de dizer que tenho na família o caso muito próximo de uns pais que maltrataram a sua filha, fizeram tudo o que puderam para a denegrir, magoar, prejudicar, nem na doença dessa filha encontraram justificações para engolirem orgulho/maldade e virem dar-lhe um simples abraço. Sou neta dessas pessoas e sempre me lembro de em criança me contrariarem e fazerem tudo para me desagradar : desde nas minhas parcas visitas apenas me brindarem com os alimentos que detestava, a não me deixarem brincar com crianças que consideravam "inferiores". Gente deste calibre merece dó, pena por ser tão ignorante. Sou ateia e não "dou a outra face" como Jesus Cristo. O meu avô já faleceu, a minha avó espero que seja feliz durante os anos que ainda tem pela frente. De mim receberam o mesmo apoio, carinho e amizade que sempre me votaram. Zero.

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