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Elogio dos cabelos brancos

por João Miguel Tavares, em 04.07.14

 

Eu sempre adorei cabelos brancos. Não consigo explicar porquê. É assim desde que sou criança: eu pedia à minha mãe para não fazer madeixas, porque gostava de cabelos brancos. A minha avó Auriolinda, desde que me lembro, sempre teve uma magnífica cabeleira branca, que nunca me cansei de elogiar. Uma grande amiga minha já tinha imensos cabelos brancos antes de chegar aos trinta e certo dia resolveu pintá-los - é uma atitude perfeitamente compreensível, mas ainda hoje lamento esse dia. 

 

Sobretudo, sempre tentei combater o terrível preconceito de que o cabelo branco fica bem aos homens e mal às mulheres. Não é verdade. A Helen Mirren nunca teve tanta pinta como hoje em dia:

 

 

Bolas, até a Christine Lagarde, que é tudo menos bonita, consegue ter um estilo do caraças com aquela cabeleira:

 

 

Sim, sim, sim, já estou a ouvir as senhoras a argumentar: "ah, mas isso é porque o cabelo já está todo branco, quando o cabelo está todo branco claro que é muito bonito, mas quando os primeiros brancos começam a aparecer..."

 

Não, não, não. Isso é desculpa da treta. Primeiro, porque muitíssima gente não assume os brancos nem quando a cabeça está toda branca. Segundo, porque quando os primeiros brancos começam a aparecer também é muito bonito. E por isso, urge celebrar esta recente aparição de Penélope Cruz, para grande espanto de alguma imprensa cor-de-rosa:

 

 

Chiça, que bom: uma estrela de Hollywood que ainda só tem 40 anos mas já tem coragem para assumir os cabelos brancos que tem na cabeça. Claro que no próximo filme eles desaparecem, mas, de qualquer forma, esta é uma foto para guardar.

 

O cabelo grisalho é bonito em toda a gente. Nos homens e nas mulheres.

 

Toda esta conversa por causa da Teresa, claro. Os seus primeiros cabelos brancos começaram a aparecer e eu adoro ver aqueles pequenos fios de branco no meio do seu cabelo escuro. Só que ela já me avisou que é possível que venha a fazer madeixas. Eu protesto, protesto, protesto, imploro que não faça tal coisa, mas é possível - diria mesmo: é provável - que ela não me venha a ligar nenhuma.

 

Faço notar - é outra coisa que também sempre disse desde muito pequeno, vejam como há tanto tempo habita um pequeno stylist dentro de mim - que nada tenho contra cabelos pintados. Só não gosto de cabelos pintados para encobrir cabelos brancos. Uma miúda pintar o cabelo de azul aos 18 anos, é lá com ela. Depois sai. Mas pintar o cabelo para esconder a idade que se tem é uma coisa que me encanita.

 

Além de, por vezes, ficar ridículo - cores escuras em avozinhas de 80 anos é quase sempre mortal -, está filosoficamente errado. O avanço da idade é para ser celebrado, não para ser escondido. Cada cabelo branco grita "eu vivi" do alto das nossas cabeças. Pintar cabelos brancos é apagar a história, é lutar contra o tempo, quando a idade deve ser sabiamente acolhida e não coloridamente escondida.

 

Envelhecer é um processo complicado para toda a gente, e por isso a pintura tem sempre alguma coisa de negação. Claro que quase ninguém pensa nisto assim, e até corro o risco de estar a ser injusto para quem simplesmente pinta o cabelo porque gosta, ao mesmo tempo que é uma super-avó super-confortável com a idade. Peço antecipadamente desculpa a essas pessoas por isso. Não é minha intenção ofender ninguém.

 

Mas entristece-me por antecipação o desaparecimento do branco da cabeça da excelentíssima esposa, eu que olho para cada fio do seu cabelo como algo que também é um pouco meu. Aquela melanina foi sendo consumida ao meu lado. Os nossos melanócitos estão cansados tal como nós vamos estando cansados. Os cabelos brancos deveriam ser os mais amados - são aqueles que viveram mais depressa. Ser-lhes fiel, é sermos fiéis a nós próprios.

 

Não pintes. Por favor, por favor, por favor.

 

publicado às 09:55


1 comentário

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De Nânci a 04.07.2014 às 11:07

Eu com 24 já tenho uma boa maquia deles para colecção. Acho que como vieram tão cedo (penso que vi o 1º aos 20) não me afectaram nada. Não os escondo, mas tenho de recusar diariamente as inúmeras propostas para mos arrancarem!

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