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No mundo de Anfisa

por João Miguel Tavares, em 08.04.14

Ontem deparei-me com uma reportagem fotográfica que me fez lembrar esta outra, só que em vez dos Estados Unidos estamos na Rússia, e em vez de violência doméstica temos um casal de toxicodependentes a pedir na rua e a viver em prédios imundos com uma criança pequena, muito loira e muito bonita (dir-se-ia que a a cara de anjo louro dá sempre uma ajuda no dramatismo destas situações).

 

De resto, temos também uma jovem fotógrafa em início de carreira (neste caso, Irina Popova), que de um dia para o outro vê um dos primeiros trabalhos que fez na vida - as primeiras fotos foram tiradas em 2008, e mais ou menos por acaso, quando encontrou uma toxicodependente a transportar uma criança no meio da rua - tornar-se viral, e não da forma que ela mais gostaria.

 

A história está toda contada aqui ou aqui, e centra-se na pequena Anfisa e nos seus pais, Pasha e Lilya. Mais propriamente, estes senhores:

 

 

E aqui está uma das primeiras fotos de Popova, quando encontrou Lilya com Anfisa no meio da rua:

 

 

O casal tinha por hábito utilizar a criança enquanto pedia nas ruas.

 

 

Mas foram as fotos da casa onde ambos viviam que mais impressionaram as pessoas, parecendo traçar um quadro de total negligência e abandono.

 

 

 

 

Por isso, quando Popova expôs as fotografias pela primeira vez, as reacções de indignação não se fizeram esperar. Acusaram-na de colocar o seu interesse de fotógrafa à frente dos interesses da criança e de não ter denunciado o caso às autoridades. A polícia quis saber onde moravam Lilya e Pasha.

 

Irina Popova argumentou que as fotos não contavam toda a verdade, e que a criança era amada pelos pais. Algumas das suas imagens dão, de facto, essa ideia.

 

 

 

 

E disse mais: disse que a sua ideia original era a de discutir a possibilidade da existência do amor nas margens da sociedade. Não quis mostrar apenas uma criança negligenciada, mas também uma criança amada.

 

Diz Popova: "A verdade é que a vida é complexa, e há muitas situações demasiado complicadas para nós as julgarmos." É difícil não concordar com ela.

 

Vários anos passados, Lilya deixou a casa, o marido e a filha. Coube a Pasha ficar a tomar conta de Anfisa, enquanto trabalha como electricista em part-time. Anfise anda na escola. O pai chama-lhe "princesa".

 

 

Aqui, pode ver um vídeo onde Irina Popova fala do caso, que até já chegou a livro.

 

publicado às 09:21


4 comentários

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De Maria Cruz a 08.04.2014 às 13:03

Sim, o facto dela ter um ar angelical faz com que olhemos com mais atenção.
Outro dia estávamos a assistir Babel, e na cena do deserto, em que as crianças ficam sozinhas eu sentia que meu marido estava colapsando. Muito mais do que na cena das crianças marroquinas, que era francamente mais dramática. Acho que ele identificava nossos filhos muito mais com os americanos, se transportava mais para a situação.
Como naquele vídeo em que mostra uma criança europeia ( acho que irlandesa) passando a situação de uma criança síria:

http:/ www.youtube.com /watch?v=RBQ-IoHfimQ
Imagino que já tenha visto.

Mudando de assunto, vi hoje no New York Times uma reportagem que imagino que daria uma boa discussão no seu blog ( o meu é apenas um monólogo), já viu isso? :

http://www.nytimes.com/2014/04/08/us/2-tots-a-sailboat-and-a-storm-over-parenting.html?hp
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De Anónimo a 08.04.2014 às 11:30

A utilização deste tipo de posts confrangedores com o intuito de gerar visibilidade é abusiva, na minha opinião. É que não há necessidade.
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De João Miguel Tavares a 08.04.2014 às 13:10

Só posso falar de temas cor-de-rosa com o "intuito de gerar visibilidade", é isso?
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De Anónimo a 08.04.2014 às 14:21

O seu blogue está cheio de posts que, não sendo "cor-de-rosa", abordam questões dramáticas que numa primeira análise até o podem não ser.
Esses, sim, criam visibilidade por mérito próprio.

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