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A Suzana Cheong deixou-me ontem esta mensagem no Facebook:
Tive uma relação de 26 anos com o meu ex-marido. Eu pensava que ía chegar aos 90 ao lado desse homem. A questão para mim é e será: qual é a receita para a durabilidade do Amor?
Eu pedi-lhe autorização para usar esta sua pergunta num futuro post (que é este), mas para não ficar demasiado frustrada com o conteúdo daquilo que pretendia escrever, adiantei-lhe logo a conclusão. A minha resposta à pergunta sobre a receita para a durabilidade do amor é... não faço patavina de ideia.
Tal como penso que já ficava sugerido no final do meu primeiro post, tenho uma resistência intuitiva a achar que existe um procedimento qualquer que assegure uma relação longa e feliz. Olhando para alguma da investigação moderna, mais depressa apostava o meu dinheiro na importância de determinados cocktails químicos para justificar o prolongamento do amor do que naquelas coisas que nos habituámos a ouvir sair de bocas mais conservadoras, que falam na importância do sacrifício, da abdicação e da dedicação ao outro.
Como é óbvio, qualquer relação feliz envolve sacrifício, abdicação e dedicação ao outro. E claro que se eu viver obcecado comigo próprio, a relação tem tudo para correr mal. O meu ponto está em achar que já existe uma espécie de pré-disposição para essa entrega. Ou seja, será que eu amo porque me sacrifico ou sacrifico-me porque amo? Eu, que já conheci algumas pessoas para quem o altruísmo era uma forma de vaidade e de compensação um bocadinho egoísta, tendo a apostar na segunda. Sacrifico-me porque amo.
É por isso que não posso acompanhar, regressando às reacções ao meu primeiro post, comentários como o de Daniel Cabanas (de 15.01.2014 às 12:41) ou de Fernando Saraiva (de 15.01.2014 às 19:00), herdeiros de uma linha mais ou menos apocalíptica que vê o mundo imerso em pecado e afastado dos verdadeiros valores cristãos.
O casamento hoje em dia não está em grande forma, mas duvido que fosse muito melhor no Portugal de há 50 ou 60 anos, numa altura em que marido e mulher, ainda que se odiassem, eram obrigados a permancer juntos, a maior parte das vezes em relações profundamente desiguais e apenas por exigência social.
Portanto, não olhem, por favor, para o meu discurso como algo de conservador, no sentido de estar a defender a pureza de um ideal que nunca existiu, ou sequer a reclamar o regresso à família tradicional. A minha única intenção foi defender as possibilidades do amor, hoje em dia tão acossado no círculo em que me movo. Se reclamo alguma coisa, é mesmo uma protecção do direito das minorias - que é aquilo em que os monogâmicos convictos se tornaram - à afirmação da sua felicidade sem um olhar de profunda desconfiança.
Mas para dar uma resposta ao anónimo que comentou a 15.01.2014 às 20:32, e que disse
Poças... ó João Miguel, com a sua narrativa de perseguição e martírio, já está a formar uma espécie de movimento escatológico.
devo dizer que não, que para já ainda não estou a pensar nisso (mas gostei muito do "narrativa de perseguição e martírio"). Fico apenas contente por reafirmar que nem todas as relações são necessariamente consumidas pelo tempo.
Os casais felizardos podem até ser apenas uns sortudos do caraças, que fizeram muito menos do que imaginam para continuarem juntos, e a quem simplesmente saiu o bingo da compatibilidade genética ou hormonal. Mas - lá está -, seja por que razão for, eles existem.