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O amor seria menos intenso se não tivéssemos filhos? #2

por João Miguel Tavares, em 15.10.14

Voltemos, então, à questão que a Ines coloca nos comentários a este post:

 

O amor seria menos intenso se não houvesse crianças? Poderiam ser um casal sem filhos muito feliz!

 

Como já disse no post anterior, acho até que poderia ser mais intenso, se encararmos o conceito de "intensidade" num sentido próximo da paixão e da multiplicação de gestos de amor. Os filhos atrapalham muito as relações à filme romântico de Hollywood - e as famílias que se vêem nos anúncios de televisão nunca são parecidas com as nossas.

 

Já o disse várias vezes a amigos, e penso que também aqui no blogue: os filhos podem perfeitamente dar cabo de um casamento. Convém que estas coisas sejam verbalizadas com a devida secura, porque eu detesto discursos cor-de-rosa que não preparam as pessoas para os desafios que têm pela frente.

 

Portanto, é evidente que não só poderíamos ser um casal muito feliz sem filhos, como diz a Ines, como os filhos se fartam de atrapalhar a felicidade do casal. Essas são alturas, de esgotamento e falta de paciência, em que somos convidados a olhar para a frente e suportar a suspensão das gratificações imediatas, em nome de um futuro mais solarengo que, convenhamos, nem sempre é fácil vislumbrar, tão cinzento está o céu.

 

Já falei abundamente sobre isso há um ano e meio, num post chamado Dilema dos amantes, que até tem grande música a acompanhar. Vão lá e leiam, se vos apetecer.

 

Claro que o martelo pneumático filial tem esta vantagem: quando ele pára e se faz silêncio, parece que estamos no céu. Falei sobre isso aqui, a propósito da minha última viagem a Nova Iorque com a Teresa. Uma citação desse texto:

 

É curioso quando tanta gente opõe o amor à paixão. Vocês já ouviram de certeza essa história: a paixão é aquela coisa que se tem no início de uma relação mas que nunca mais volta, comida pelas traças do tempo. Com sorte, resta o amor, coisa saborosa mas devidamente pacificada. Pois bem, eu proponho-vos esta experiência: escolham bem o marido ou a mulher, arranjem uma catrefada de filhos, misturem tudo num quotidiano frenético, e ao fim de muitos anos tirem de repente do caminho, por poucos dias que seja, todo o frenesim, todo o trabalho, todos os filhos, todo o stress. Eu garanto-vos - vão parecer novamente adolescentes de 18 anos. Com a vantagem de terem a experiência de 40.

 

Ora, sendo tão divertido o tempo em que estou apenas com a excelentíssima esposa, e parecendo eu tantas vezes contrariado na minha paternidade sofrida, é natural que a Ines pergunte: 

 

Ou então, teve filhos só porque a Teresa queria? E vive uma vida completamente contrariado? Vezes quatro?

 

São excelentes questões. Tão boas que não tenho tempo para lhes responder agora. Voltarei a elas amanhã.

 

326_Loving_For_Keeps_Cartoon_Love_me_forever.jpg

 

publicado às 09:53


10 comentários

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De Monica a 15.10.2014 às 17:38

Boa tarde,
Nao conhecia o blog e tive uma agradavel surpresa ao encontra-lo e começar a ler.
Quando vi que tem 6 filhos, e estando eu com 26 anos a começar a pensar tratar desse assunto veio logo a cabeça a grande questão "nos dias de hoje como é possivel ter rendimentos para podermos ter 3,4,5 ou ate 6 filhos" Eu gostava ate poder ter 3 mas nao sei como é possivel gerirmos o orçamento familiar de forma a que tal seja possivel.
Podia criar um topico relativamente a isso para pessoas como eu que têm essa curiosidade/duvida.

M.Cunha
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De Olívia a 15.10.2014 às 17:51

são "só" quatro filhos...
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De Sílvia a 16.10.2014 às 11:42

João, permita-me responder!

Mónica, leia o perfil das pessoas do blog e perceberá, sem necessidade de tópicos! O João é jornalista, a Teresa é médica, ambos já não têm a sua idade, o que quer dizer que já trabalham há mais tempo, tendo por isso empregos mais estáveis e onde devem ganhar razoavelmente (deduzo eu), comparando com quem começa a trabalhar agora nestas condições. Logo terão mais possibilidades económicas (devido aos ordenados) para criar os 4 (quatro e não seis) filhos que têm.
Não sei o caso da Mónica, mas eu não teria possibilidade/estabilidade para isso (com muita pena minha), mesmo passando a roupa e os materiais de puericultura de uns para os outros, dar-lhes de comer, fraldas e mais tarde escolas, seria um suicídio financeiro! Por isso basta a Mónica fazer contas ao dinheiro que entra em sua casa e ao que sairia com tantos filhos. Tenha o 1º e depois terá essa noção!

E eu sou apologista do "tudo se cria", mas sem suicídio financeiro!!
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De Mário Cordeiro a 15.10.2014 às 13:50

Olá João e restantes
Creio há duas coisas que não podem ser confundidas: uma, a relação entre dois elementos de um casal, na maioria dos casos um homem e uma mulher, e a paixão (que depois se transforma em amor) ente os dois, na perspectiva natural da atracção, enamoramento e arrebatamento que existe entre os humanos, com várias nuances, sem necessariamente ser para procriar - erotismo, sexualidade, companhia, cumplicidade, intimidade, projectos a dois (entre os quais os filhos), etc.

Outra coisa, é a relação parental que representa terem ambos conseguido um objectivo que qualquer (repito: qualquer!) ser humano persegue desde os 18 meses de idade, que é ter filhos (fantasiados, afiliados, projectos ou mesmo reais) como forma de, após ter consciência da finitude da vida, arranjarmos prolongamentos que nos conduzam à Eternidade. Para este "projecto" tentamos angariar um parceiro (geralmente o melhor pai ou melhor mãe do mundo... que moram curiosamente lá em casa!), e assim se estabelecem relações parentais, seja com o Ruca ou a irmã do Ruca, seja com o Manel ou a Maria lá da escola, e finalmente, no final da adolescência, com alguém de uma forma mais estruturada. Não quer isto dizer que uma pessoa que não tem filhos seja "infeliz ou menos realizada, porque acaba por reflectir essa pulsão noutras pessoas e noutras actividades, como os projectos profissionais e a criatividade.

O amor parental pode potenciar o amor conjugal, mas falamos de realidades diversas. Por outro lado, pode não haver nem um nem outro, ou nem os dois, mas geralmente são coisas que decorrem com o tempo, num processo em que as coisas boas (mesmo que escassas) são trituradas pelo ressentimento, e sentimentos de rejeição, agressão , desamor, desamparo e traição. É por isso que é muito difícil acabar uma relação conjugal e manter uma excelente relação parental. É possível, claro, e desejável, mas a confusão dos dois relacionamentos não facilita as coisas.
PS. quanto à Igreja, é curioso ver que os países de natalidade mais baixa, na Europa, são os "católicos", como Portugal (campeão mundial), Espanha e Itália... ou não seguem as directivas da Igreja, ou então andam "mal de cama"... - um assunto para o JMT investigar, como jornalista, claro... (não estou a insinuar voyeurismo!).


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De Sílvia a 15.10.2014 às 11:53

Acabei de ler isto e acho que apoia o que o João diz, também sem floreados! Se estiverem interessados em ler: http://uptolisbonkids.com/2014/09/21/ser-uma-boa-mae-esta-a-tornar-me-numa-ma-mulher/
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De Julia, sem acentos so para irritar a 15.10.2014 às 11:14

Bem mesmo a calhar, esta semana estreou uma série nova, que dá pelo chatinho nome "The Affair", mas que como está a ter muito boas críticas despertou a minha curiosidade em ver. A série fala dos efeitos emocionais de uma relação extraconjugal. Dito isto, parece que não tem nada a ver com o post em si, no entanto, se forem ver o episódio piloto em que uma das personagens principais, um homem casado com 4 filhos, se envolve com a outra personagem principal (bem mais feia que a mulher, diga-se), porque está saturado da vida conjugal. Spoiler alert, nos primeiros 20 minutos do episódio, ele é interrompido pelos filhos duas vezes quando está a tentar fazer o amor com a sua esposa. A série deixou-me a pensar, talvez os leitores do PD4 queiram ir ver o piloto e comentar o que acharam.
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De Sílvia a 15.10.2014 às 11:07

Eu acho que houve uma falha na comunicação, porque o João apenas disse que os filhos são fruto do amor de um casal (em princípio e com as devidas ressalvas). É simples de compreender. Ele não disse que quem não tem filhos se ama menos, há casais que não podem ter filhos e amam-se de igual maneira.
Ele apenas disse que um filho é fruto de amor. A Inês interpretou da maneira que quis (a interpretação é assim mesmo!!). Sinceramente nem entendi o raciocínio da Inês (pode ser falha minha, admito!) em relação ao texto do João; isto é, entendo o que ela diz, mas não me parece lógico como resposta ao post.
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De Sílvia a 15.10.2014 às 11:00

Eu acredito que os filhos apenas realcem/aumentem o que já existe no casamento. Se o que já existe for bom, fica melhor e une mais o casal (apesar da falta de tempo entre o casal e restantes coisa que realça aqui!). Se for mau, fica pior e possivelmente acelera um divórcio (que se calhar já era inevitável). Daí muitos casais se divorciarem logo depois de terem um filho.

Adoro a forma como "fala" (escreve) destas realidades de casamento e filhos, sem muitos floreados, sem paneleirices. Ao contrário da sociedade, que tem tendência a falar só do bom, como se fosse uma coisa muito má falar-se a verdade como ela é!
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De Mara a 15.10.2014 às 10:43

Quando conheci o meu marido disse-lhe logo que queria ter filhos cedo (bem antes dos 30) e que queria ter "muitos" (sendo que muitos era, no mínimo, 3). Ele nunca quis especialmente ter filhos. Sempre disse, como o João, que é muito feliz apenas com livros, música e internet. Curiosamente, eu também, mas sempre senti que viveria uma vida incompleta se não tivesse filhos.

Por isso, na realidade, ele teve filhos porque eu quis. E teve quatro! Adora-os de paixão, mas sei que concordou com tê-los, antes de mais nada, para me fazer feliz a mim. Por isso, cada um deles é uma prova de amor.

Não percebo a dificuldade em compreender isto, que acho que é o que o João também tem dito nos últimos posts. Quando se ama, faz-se cedências em nome do outro. Da vida do outro, da sua felicidade. Eu também não vivo na cidade que escolheria sozinha, nem na casa com quintal nos arredores que adoraria, porque sei que ele é mais feliz num apartamento central, com café e quiosque ao virar da esquina. A vida que construímos a dois não pode ser igual à que teríamos sozinhos. Por isso agora somos 6, e somos muito felizes. Daqui a uns anos seremos outra vez só dois, e ainda teremos várias décadas para gozar isso.
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De Patrícia a 15.10.2014 às 10:39

Bom dia,

Eu acho que a questão que se coloca é uma falsa questão, pela simples razão de que medir a "intensidade" de uma relação (amorosa, filial, etc.) não é objectivo. Para alguns casais, é possível que a intensidade seja muito sexo. Para outros, muita "rambóia" - festas, viagens, etc. Para outros, intensidade pode ser partilhar intimidade emocional, ideias políticos ou sociais. Para outros, estar sempre juntos. Enfim… Ou seja, para cada tipo de intensidade, os filhos podem ou não interferir de forma mais ou menos intensa. Mas como também pode interferir o trabalho, o quotidiano (esse sacana…), outras pessoas, os próprios, as famílias de uns e outros, a saúde ou ausência dela.

Por isso não acho que os casais com filhos sejam mais ou menos "completos" ou mais ou menos intensos que os outros. Desde que as suas escolhas lhes permitam manter, ainda que esporadicamente, é certo, que isso do amor e uma cabana é chato, o nível e tipo de intensidade que lhes permite continuar a crescer em conjunto e a querer partilhar os tais quotidianos com a outra pessoa.

Posto isto, e como diz o JMT, acho que também é inevitável que tudo o que tire tempo ao casal - e quem mais do que os filhos, sobretudo muito pequenos? - pode retirar oportunidades de "intensidade". Mas talvez mais do que aquilo que é retirado pelos filhos, o importante, para o casal seja nem tanto o que os filhos acrescentam, mas o que permanece - mesmo que escondido e reencontrado numa viagem a NY, por exemplo. :)

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