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Regressemos então à questão das actividades extra-curiculares, com as quais enchemos boa parte dos tempos livres dos nossos filhos. Eu já tinha dito que concordava com o comentário da Mara, desde longo na diferenciação, que me parece muito inteligente, entre actividades que servem para os formar (ou seja, que fazem parte do caminho educativo que traçámos para eles) e actividades que servem para os ocupar (porque trabalhamos e não temos tanto tempo para estar com eles quanto gostaríamos).

 

Eu tenho pensado muito sobre isso nos últimos tempos por causa da Carolina, que agora está no 5º ano e tem um horário cheio até ao tecto de actividades extra-curriculares. Aliás, no seu caso, há ainda uma segunda divisão de conceitos que faz sentido fazer, entre: 1) as actividades que são decididas por nós e 2) as actividades que são escolhidas por ela. No nosso caso, é este cruzamento do 1+2 que me tem assustado um pouco - de segunda-feira a sábado de manhã, a miúda quase não pára. Recentemente, desenvolveu um interesse pelo xadrez que até as tardes de domingo por vezes a ocupa.

 

A minha primeira tendência é dizer que isto é demasiado. Além das aulas normais e do ensino articulado, que a obriga a sete horas de música semanais, ela ainda tem aulas de inglês, natação (aos sábados de manhã) e catequese. E depois vêm as suas escolhas pessoais nas AEC da escola, que, de facto, é óptima nas opções que oferece. Aí, a Carolina escolheu fazer teatro, esgrima e xadrez. Dito assim, em comboio, quase apetece chamar a Comissão de Protecção de Menores para resgatar a criança a este regime de escravatura.

 

Só que, até agora, ela está longe de se sentir escrava - excepto na música, que ela diz que preferia não ter (a não ser quando vem gente cá a casa e ela adora mostrar o que já sabe fazer no piano). Mas aí, de facto, não tem hipótese: nós consideramos as aulas de música e de inglês essenciais na sua formação, e explicamos-lhe com frequência que para nos faz tanto sentido ela dizer que não quer estudar música como dizer que não quer estudar português, matemática ou história. Tem de ser.

 

Claro que quando a vejo às dez da noite a tentar resolver problemas de xadrez para o dia seguinte, a minha tendência é ter alguma pena dela. Mas a verdade é que no caso do xadrez é uma opção sua - e se não estivesse a fazer isso estava agarrada ao tablet ou ao telemóvel ou à televisão a jogar jogos estúpidos ou a ver séries idiotas. Eu vou tentando estar atento a alguns sinais exteriores de cansaço, que acho que até podem surgir quando os testes apertarem, mas por enquanto aquilo que tenho é uma filha com uma estamina e uma energia invejáveis - uma anti-couch potato, que é um problema que eu detecto cada vez mais em crianças ociosas e excessivamente ligadas à net.

 

A verdade é que nada impede que a Carolina descanse a jogar xadrez ou com um florete nas mãos, tal como eu descanso a ler um livro ou a jogar à bola. Até porque em nada disso ela tem a pressão de ser muito boa. Ou seja, o segredo é ela sentir as AEC como fazendo parte dos seus tempos livres e de brincadeira, e não como obrigações (como acontece com a música ou com o inglês). Daí nós lhe termos dado total liberdade de escolha nesse campo - foi ela quem decidiu fazer aquelas actividades e as suas tardes foram organizadas em conjunto com ela. Acredito que se esse balanço entre deveres e prazeres for bem elaborado, nada impede que uma criança seja feliz dentro de um calendário que nos parece muito apertado.

 

Daí aquele meu momento de consolo, descrito no post sobre a hiper-paternidade:

 

Don’t worry about overscheduling your child. Kids who do extracurriculars have higher grades and self-esteem than those who don’t, among many other benefits, says a 2006 overview in the Society for Research in Child Development’s Social Policy Report.

 

O estudo de que Pamela Druckerman (a autora do texto sobre a hiper-paternidade) fala pode ser encontrado aqui e, de facto, ele lança um olhar muito positivo sobre as actividades extra-curriculares no desenvolvimento e sucesso académico das crianças.

 

Tudo indica que uma vida cheia é sempre uma vida boa, tanto aos sete como aos setenta e sete.

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publicado às 10:14


2 comentários

Sem imagem de perfil

De LA-C a 03.11.2014 às 16:22

JMT, para o caso de não o teres visto, toma lá um texto interessante:
http://www.ionline.pt/iopiniao/dificuldades-aprendizagem/pag/-1
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De João Miguel Tavares a 03.11.2014 às 16:35

Muito interessante, mesmo. Vou já roubar - até porque receio bem estar a passar por algo semelhante com o filho número 3.

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