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Ainda em relação ao tema da autonomia dos miúdos abordado na semana passada, fica aqui um resumo de alguns comentários muito pertinantes ou de óptimas partilhas de experiências de vida, entre os quase 150 leitores do PD4 que se deram ao trabalho de escrever sobre o assunto. O meu obrigado a todos.
Ana Isabel:
Temos três raparigas de 25, 21 e 16 anos, por isso eu já tive tempo de me habituar a soltá-las. Que é o que a Teresa precisa, de TEMPO. Tempo para conseguir gerir a preocupação constante que é ter um filho na rua sozinho. Tempo para conseguir perceber que não vai acontecer nada. Tempo para se habituar à ideia que os filhos estão a crescer e a ficarem independentes, e que afinal até se conseguem desenrascar sozinhos! Tempo para aprender a confiar neles. Garanto-lhe que à terceira (no vosso caso, à quarta), quase que já crescem sozinhos! A primeira é que é mais complicada. Mas o início da independência deles é o começo de um novo ciclo em que nunca mais vamos estar descansados. É assim a vida. Menos trabalho físico, mas psicologicamente muito complicado.
José Moreira:
A culpa é das notícias. O facto de termos acesso a tanta informação, sobre tantas catástrofes e maldades e azares, faz com que tomemos como regra, e como perigos iminentes, situações que são, no nosso país, muito raras. O mundo não está pior. Nós é que sabemos demais. Penso que será esse o principal motivo para sermos pais super protectores.
Ana:
Acho importante que se dê o tal voto de confiança, que se concedam algumas pequenas liberdades, mas, na mesma proporção, acho que devemos responsabilizar os petizes e atribuir-lhes pequenas tarefas diárias. Porque isso é que é crescer. Ter direitos e deveres, poder ir a pé, mas ter de fazer a cama, arrumar o quarto ou o que seja.
Marta:
Eu tenho uma filha de 3 anos e dou por mim constantemente a dizer: Mariana, cuidado com o degrau; Mariana, não corras... e reparo que quando a chamo a atenção ela desacelera e fica com um ar apreensivo... obviamente. vejo logo que isto não é bom para ela. A obsessão dos pais com os filhos não é de agora. Os meus avós já o tiveram com os meus pais e os meus pais tiveram comigo (tenho 42 anos). A minha mãe passou a vida a apontar-me perigos e isso tornou-me numa pessoa com pouca autoconfiança e cheia de medo de tudo. Tanto que eu não tenho uma única cicatriz da qual me possa orgulhar...
Mara:
Concordo em absoluto com o João. Autonomia, autonomia, autonomia! Podem percorrer sozinhos pequenos percursos aos 10 anos, SIM! E ficarem sozinhos em casa pequenos períodos. Podem e devem ir comprar pão à padaria da rua, trazer o jornal do quiosque da esquina, ir à papelaria.
A galinhice generalizada está a criar incapazes e não é baseada em nenhum dado racional, mas em medos não fundamentados. Os pais tendem a achar que os filhos nunca estão preparados para crescer. Acabam nas filas de matrículas nas faculdades, porque os seus marmanjos, coitadinhos, não se podem matricular sozinhos, nem arrendar um quarto sozinhos, nem fazer um contrato de água e luz.
Tenho 4 filhos, como o João. Tenho lutas épicas com o mais velho, que não é nada fã de autonomia. O seguinte, curiosamente, e só com 7 anos, preza muito a independência e o voto de confiança que lhe damos quando o deixamos ir ao pão sozinho ou brincar sozinho na praceta. Os outros ainda são muito pequenos. A autonomia é uma coisa boa, útil, indispensável. Nem sempre é fácil, crescer às vezes é chato, outras dói. O mundo NÃO está mais perigoso do que há 30 anos, nós é que estamos mais paranóicos, mas não fazemos favor nenhum aos miúdos mantendo-os numa redoma.
Teresa A:
A minha filha é um "crash test dummy", passa a vida a cair e a ferir-se. Por minha vontade andava sempre a protegê-la mas acho melhor ser a mãe a sofrer do que a pequena, que adora correr, saltar, trepar. Magoa-se? Sim. Mas não tem medo e é uma crianca mexida e feliz. Se a meter numa redoma talvez evite as nódoas negras, os arranhões, os galos, os ossos e os dentes partidos (sim, já tivemos tudo isto nos 4 anos de vida da garota, várias vezes) mas crio uma miúda medrosa e dependente. Concordo com a pessoas que dizem que se a Carolina quer, deve ir. Se a Carolina acha que ainda é cedo, aí é melhor ver...
Susana Mendes:
Para que as mamãs se habituem aos filhos irem sozinhos para a escola posso aconselhar a minha estratégia, testada por mim no 5.º ano (há dois anos) e que resultou. Na primeira semana - levar à escola. Na segunda semana - ficar a meio da rua, com o portão da escola à vista e vê-la entrar. Na terceira semana - ficar no princípio da rua da escola sem avistar o portão, e ficar a vê-la até se perder de vista... e por aí fora, encolhendo sempre o nosso caminho. Rapidamente conseguimos que ele saísse da paragem do autocarro, e eu seguisse. Eu... sozinha. Nota: Adaptem o número de semanas de estágio em cada etapa conforme a vossa angústia.
JP:
Lembro-me de uma vez ter visto aquela que considero a mãe mais histérico-protectora de todas as mães que vi até hoje: além de andar sempre atrás da filha [no parque], levava-a ao cimo do escorrega, dizia-lhe para esperar por ela antes de descer. A miúda só podia descer quando a mãe estava em baixo à espera dela. A melhor foi quando a menina começou a correr e aquela mãe desatou aos berros: "Não corras que podes cair!" Que freak!!! Mas como se pode pedir a uma criança para não correr?!
Joana:
Concordo com a Teresa. A Carolina só mudou de escola este ano, ir já sozinha para a escola parece-me precipitado. Muitas mudanças ao mesmo tempo. Talvez para o ano, quando ela já conheça colegas que possam fazer o mesmo caminho que ela, para não ir completamente sozinha, por exemplo. Deve haver uma transição das coisas. Ir já já, escola nova, 10 anos, muito cedo.
Isabel Prata:
Na minha cabeça todas as tragédias são possíveis, mas tenho vindo a aprender a lidar com isso, porque é assim que tem que ser. Tenho 3 filhos, 21, 20 e 10, e não há volta a dar, viveremos sempre angustiados, que eles sejam atropelados, que tenham um acidente, que andem em más companhias (por acaso o cenário do rapto nunca me atormentou). Mas os filhos não são nossos são do mundo e a nossa obrigação é dar-lhes asas, procurando que as calças sejam à medida das pernas. Só assim eles ganham autonomia e só assim eles podem aprender a lidar com as situações e a evitar os perigos. E ir estando atentos aos sinais que eles dão.
Hoje há uma ajuda muito grande, os telemóveis. Mas mesmo assim é só uma ajuda, e que até se pode tornar contraproducente: no dia em que por alguma razão eles não atendem, entramos em pânico. Quando os mais velhos começaram a sair à noite, iam cheios de recomendações, sobretudo em relação ao álcool. De início íamos buscá-los, depois começaram a vir de táxi, depois com amigos, depois tiram carta... De início não adormecia antes de chegarem, agora, sossegada por os saber ajuizados, apenas quando acordo de manhã vou ver se eles estão nos quartos. É assim, o irem sozinhos para a escola aos 10 anos é só uma pequena etapa. Como dizem os antigos a solução é "alma até almeida".
Patrícia C.:
Uma vez numa reunião no ATL alguns pais (de miudos de 5.º e 6.º ano) disseram que não permitiam que os filhos fossem de autocarro da Carris fazer uma visita de estudo acompanhados por 3 monitores porque iam muitas pessoas estranhas dentro do referido autocarro!
E ainda hoje tenho amigas cujos filhos de 13/14 anos não têm autorização para irem sozinhos para a escola que fica a 10 minutos de distância a pé nem sequer à padaria que é ainda mais perto!
Teresa Power:
No ano passado, o David fez sete anos. Convidou cinco amiguinhos para lanchar connosco e brincaram a tarde inteira entre o nosso jardim e o descampado por detrás da casa. No fim do dia, os pais vieram buscar os filhos, e qual não foi o seu espanto ao vê-los à distância, empoleirados sobre várias árvores... E comentaram comigo: "Não sabia que o meu filho era capaz de subir às árvores!" Ou: "O meu filho passa o tempo todo com os jogos de computador... Não imaginei que lhe soubesse tão bem estar sobre uma árvore!" E todos, todos falaram da saudade da sua infância, quando também eles subiam às árvores... Cá em casa vive-se uma "negligência benigna" muito natural, que as pessoas atribuem ao facto de serem muitos, mas que é muito mais do que isso: é propositada!
Dr. Mário Cordeiro:
Como pediatra, pai de crianças de 11 e 12 anos que vão sozinhas para a escola, e como fundador da APSI, acho que tem toda a razão. Aliás, já que refere o caso Maddie, só houve um, mas foi repetido "ad nauseum" de modo a parecer que todos os dias desapareciam dezenas de crianças no Algarve... e resta a saber o que realmente aconteceu, ou se o "o pecado não morava afinal ao lado". Ainda com esta claustrofobia em que colocamos as crianças (nós em relação a elas, entenda-se), não se esqueçam, leitores do PD4, que 95% dos abusos sexuais de menores são cometidos por familiares e conhecidos da criança... leram bem. 95%.
E também estou de acordo com o Luís Januário, meu colega e amigo, que uma coisa é correr riscos de forma controlada, outra é estar em situações de perigo. Risco é probabilidade de acontecer alguma coisa. Perigo é uma situação que, por si, tem tudo para acabar mal. Uma diferença que pode parecer meramente semântica, mas que é fundamental neste contexto. Claro que é preciso ensinar as crianças, mostrar-lhe os caminhos melhores, debater com eles e rever os riscos e perigos, no fundo, gastar tempo nessa missão que é educar e ensinar/aprender.
Não sou adepto do "antigamente" - se não, não tinha dedicado 30 anos da minha vida à prevenção de acidentes e promoção da segurança infantil... - mas o excesso de protecção dá uma falsa sensação de segurança. para lá disso, como alguém bem comenta, os pais mais restritivos esquecem-se depois de coisas como a segurança rodoviária e outras coisas assim. Não há situação mais letal que a vida... mas tem de ser vivida sob pena de morrermos, quando mais não seja, de tédio e espartilhos...
A Maria João Resende já não me consegue aturar:
E se fossemos para o sofá falar sobre um filme? Ou ver fotos parvas de pessoas com ar incrível? Ou contar as novidades do Gui, da Ritinha, ou as novas conquistas da Carolina e do Tomás? E se fôssemos comentar profundamente um tema inesperado, e encontrar nuances curiosas em coisas de todos os dias?
Eu sei que já passei do prazo de me preocupar com filhos, e ainda não estou numa de netos, e que será talvez por isso que já não aguente mais estas conversas sobre bater, e não bater, e o diabo a PD4. Eu sei, também, que acompanhar os interesses dos seus leitores será uma das suas prioridades, e que o número avassalador de comentários que estes temas merecem parece indicar que o principal interesse das pessoas está aí.
Mas será que o que quer para o seu blog é ser um agregador de comentários sobre os GRANDES TEMAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL? Só???
São as "audiências" a mandar? E não irão as "audiências" matar o que me parecia ser a essência deste blog?
Não sei! Só sei que tenho saudades da vossa família, das vossas histórias, e da forma como, sem nos chapar na cara o "hoje vamos falar sobre A, B ou C", éramos convidados a pensar em coisas sérias, muitas vezes de forma bem ligeirinha. Apetece-me atirar-me para o chão e, correndo o risco de apanhar uma valente palmada que a minha mãe não hesitaria dar-me, gritar bem alto: 'QUERO O MEU BLOG FAVORITO DE VOLTA!'
A Carolina também quer o mesmo:
Antes não passava um dia sem vir cá, agora sou capaz de só vir uma vez por semana. Tenho saudades dos tempos iniciais do blog e estou um bocadinho farta de tantas discussões sobre assuntos polémicos. Quero saber sobre os "pais e os quatro" não sobre apenas e só as "discussões sobre como educar os quatro.
Três comentários rápidos a propósito disto:
1. Acho que muita gente está sobretudo com saudades da Teresa. Eu também estou. A sua ausência prolongada deste blogue tem como consequência diminuir muito a variedade dos temas, até porque boa parte do que eu escrevia também era inspirado nos seus textos. Se quiserem fazer um abaixo-assinado para ela regressar ao blogue, eu subscrevo. A última vez que a Teresa escreveu aqui foi a 6 de Junho. Passaram 24 dias. Invariavelmente, sem ela, eu tendo a ficar mais chato e meditativo.
2. As audiências não são nenhuma preocupação especial. No PD4 (isto está a pegar, Conceição M.) escrevo sobre aquilo que me apetece. Por uma razão simples: embora este blogue tenha exploração comercial, e eu sempre tenha querido que fosse assim, os rendimentos que daqui retiro não são significativos ao ponto de justificar preocupar-me demasiado com isso, ou sequer ter uma estratégia de marketing encapotada. Por aqui, e até ver, as audiências mandam muito pouco.
3. Mas se as audiências mandam pouco, a comunidade de leitores manda muito. Como me parece ser bastante visível, eu sempre privilegiei o diálogo com os leitores deste blogue. Nesse sentido, sou naturalmente sensível aos temas que mais interessam às pessoas, como é o caso da palmada. Para mim, o PD4 é uma espaço de partilha de experiências, e uma das partes mais recompensadoras do blogue é aquilo que eu aprendo com as partilhas de dezenas de outras pessoas. Nem pensar em abdicar disso. Se eu escrevo tanto aqui é também para poder vir a ser melhor pai. E bem preciso, como a Maria certamente concordará.