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O título de cima pode parecer uma pepineira e aquilo a que Nelson Rodrigues chamou o óbvio ululante - claro que viajar é giro porque estamos juntos. Mas eu pergunto: será assim tão claro? Nós cá em casa já viajámos com os miúdos imensas vezes, mas só agora, vá lá saber-se porquê, é que adquiri plena consciência deste simples facto: o mais importante numa boa viagem em família não é sair com ela mas entrar dentro dela. Ou seja, nós saímos de casa para estarmos mais próximos uns dos outros.
Paradoxal? Não para quem olhe para o frenesim diário de uma família de seis elementos em tempos de escola e de trabalho. É muito fácil estarmos a vários quilómetros de distância ao mesmo tempo que esbarramos uns nos outros na mesa da cozinha. Isso não acontece quando viajamos. Viajar, na verdade, não é ir. Viajar é, sobretudo, parar. E eu acho que descobri isso com clareza quando andei aos tiros com os meus filhos nos dois quartos do hotel da Disneyland.
O Tomás comprou uma espingarda e dois revólveres de cowboy, o Gui duas pistolas do seu Buzz Lightyear, a Carolina o fato da heroína do filme Brave (com arcos e flechas incluído), e a certa altura nós aproveitámos este imenso arsenal para uma sessão de coboiada à moda antiga, que meteu barricadas com cadeiras, reféns desprotegidas (a pobre mamã), duelos à filme de Hollywood e flechas espetadas no tecto do quarto. Foi muito divertido, e sei que esses 15 ou 20 minutos de brincadeira à faroeste se irão tornar numa das recordações mais especiais desta viagem.
Os miúdos pediam com frequência para voltar para o apartamento, sobretudo quando os obrigávamos a andar com fartura em Paris. A Teresa sentia quase sempre isso como um desperdício - afinal, como é possível estar em Paris e "não aproveitar"? Mas a verdade é que estar num quarto de hotel pode ser uma forma de aproveitar, desde que estejamos concentrados neles.
Claro que temos de os estimular, e empurrá-los para ver coisas que à partida não lhes apetecem - a cultura geral às vezes tem de ser mesmo metida a martelo. Mas, de facto, para eles sentirem que estão num sítio especial não precisam sequer de sair do hotel. Podíamos dormir na Brandoa ou na Bobadela e para eles seria igualmente especial.
Paris, como tão bem explica o Bogie à Ingrid, é um estado de espírito. Será sempre especial desde que estejamos juntos, fora do sítio do costume, sem as preocupações do costume, e com uma disponibilidade para eles que não costumamos ter.
A família chegou ao final do dia a Lisboa, e desde então:
1. Esqueci-me de uma prenda muito especial e valiosa que comprámos para a minha mãe no banco de um dos táxis (nós precisamos de dois) que nos trouxeram a casa. Como não pedi recibo (desculpa, Maria Luís), nunca mais a vou ver.
2. Tinha na caixa do correio três cartas das Finanças a informar-me que tenho de pagar um valor obsceno até ao início de Abril, ainda respeitante ao IRS de 2010 (tenho um velho conflito com os senhores da Autoridade Tributária, que acham que os meus textos não devem ser considerados ao abrigo da criação artística e literária, mesmo que posteriormente já tenham sido publicados em livro).
3. Numa mini-jogatana de futebol na sala, partiu-se (mais uma vez) uma peça de que a excelentíssima esposa gosta muito.
Se calhar é melhor voltar para Paris.