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Vamos todos para o divã?

por João Miguel Tavares, em 26.06.14

Quanto mais eu leio os comentários da Maria, da Helena, da Sofia e de tanta gente que tem a simpatia de vir opinar sobre palmadas e boa educação para este blogue, mais sou invadido pela sensação de que nós não estamos a falar dos nossos filhos - estamos a falar de nós próprios e das nossas infâncias. Estamos, de alguma forma, a ajustar contas com o nosso passado, numa espécie de "diz-me o que te fizeram e eu dir-te-ei quem és".

 

Para que não haja equívocos: eu não me estou a pôr fora disso. Não tenho pretensões de pairar acima dos outros. Acho apenas que o sacana do Freud tem razão - está quase tudo lá, na nossa infância, é lá que devemos procurar a justificação para as nossas forças e para as nossas fraquezas, e para tantos dos nossos gestos como pais. Até porque se há livros de pediatria para todos os gostos, é porque a sua função fundamental não é aconselhar-nos a educar os filhos - é serem espelhos de nós próprios, obras especializadas onde vamos procurar argumentos para sustentar as convicções que já temos à partida. 

 

publicado às 10:29


33 comentários

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De Ana Maria a 26.06.2014 às 18:53

Vou organizar o meu comentário em duas partes, para ser mais fácil de analisar :)

1. A minha mãe era obcecada pelas arrumações. Quando digo obcecada, digo que não me podia ver sentada a ver TV que arranjava logo alguma coisa para eu fazer: varrer, limpar, fazer a cama, o que fosse. Essa mania das arrumações, de ter tudo impecável - se calhar necessária, dado que éramos 4 e se cada um fizesse tenda e deixasse ficar o caos nasceria em segundos - passou até para as brincadeiras que fazíamos: se a brincadeira era às casinhas, não importava o tempo que demorávamos a montar a coisa. Quando chegava a hora de arrumar era para arrumar, nem que tivéssemos a brincar há apenas 5 minutos. Nunca um brinquedo ficava fora do lugar. Nunca.
A minha filha tem uma tenda no meio do quarto. Temos brinquedos na sala, e um caixote enorme para os arrumar (ela arruma, eu ajudo). Se alguma brincadeira fica a meio, fica assim até a terminar no dia seguinte. Gosto que tenha as coisas arrumadas (com os livros sou mais picuínhas) mas sem exagero. Na minha maneira de ver as coisas e de agir com ela, uma sala desarrumada não traz nenhum mal ao mundo. Ela é feliz assim, e assim eu sou feliz com ela.
Comportamentos assentes em experiências, vivências e frustrações passadas? Oh, yeah. Sem dúvida. Quando a vejo a brincar, lembro-me de nunca ter visto a minha mãe a brincar connosco. E isso faz-me sentar a brincar com ela.

2. Isto da palmada ou não palmada não é fácil. Posso dizer que, em quase cinco anos, nunca bati à minha filha. Nunca gritei, nunca berrei - um olhar sério basta, o nome dito em forma lenta também. Nunca fez birra, nem em casa nem fora dela, ainda que tenha amuos mais ou menos frequentes - as birras silenciosas, como lhes chamo.
Esta "façanha" é parte dela (não desafia a minha autoridade) e parte minha (sempre expliquei o porquê de cada acção, de cada comportamento, mesmo quando ela ainda não percebia o que eu dizia. Não entendia as palavras, mas perceb(er)ia que algo pensado estava por detrás daquela decisão).
Não bater nem berrar traduz a minha forma de ser, de estar, a forma como pensei (antes) e exerço (agora) a parentalidade. Sim, li Carlos Gonzalez, sim, li Estivil, sim, li muita coisa. E tenho cabeça para pensar, também :)

Mas apesar de (até agora...) nuca ter batido nem gritado não significa que não fique enervada. E gostava de deixar aqui escrito que, meus amigos, manter a calma é, muitas vezes, um quase sacrifício. Quando vejo que já falei, já soletrei o nome, já olhei de forma séria, já conversei, e o amuo ou a insistência ("mãe, mãe, mãe, MÃAAAAAEEEEEEEE") não passa, tenho vontade de mandar um berro. De dizer "porque no te callas?", de atirar um "oh pah, porra, cacoiso" .
Mas - lá está - a educação que lhe quero dar não é esta, quero que perceba que é possível manter a calma mesmo em situações exasperantes. E, por isso, respiro fundo pela enésima vez e explico. Ou saio de cena, e ela que fique a chamar.

E pronto, era mais ou menos isto.

JMT, quanto lhe devo?


(nota - os meus pais baterem-me algumas vezes, deram-me palmadas de quando em vez, amaram-me todos os dias. tive uma infância feliz. ainda que com as coisas todas arrumadas)

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